sobre criar com modelos generativos
Modelos generativos não criam do nada. São espelhos — espelhos fragmentados de tudo que já foi feito, dito, cantado. Cada prompt é um ato de buscar a própria essência nesse caleidoscópio de possibilidades.
Quando dirijo palavras ao modelo, não estou apenas pedindo algo. Estou negociando com o latente space — esse território difuso onde padrões dormem, aguardando serem convocados pela especificidade do meu desejo artístico.
Criar com IA é escavar. Cada geração é uma camada de terra removida, revelando algo que estava ali — latente, comprimido em bilhões de parâmetros. Não é magia. É arqueologia do possível.
"A máquina responde ao que eu peço, mas só descubro o que realmente quero quando escuto o que ela oferece e digo: não, ainda não é isso."
Iteração não é correção de erro. É conversa. É dança. É o modelo me mostrando facetas que eu não sabia que buscava, e eu refinando o olhar até reconhecer: isso, isso aqui.
Barthes disse que o autor morreu. Foucault disse que o autor é uma função. Na era dos modelos generativos, o autor retorna como curador-diretor.
Minha autoria está em:
A IA não substitui. Ela amplifica a capacidade de exploração. Mas quem navega sou eu.
Existe algo profundamente alquímico em trabalhar com modelos generativos. Você não controla cada pixel, cada frequência. Você convoca.
É como trabalhar com fogo: você pode direcionar a chama, alimentá-la, soprá-la — mas a forma exata que ela toma tem vida própria. E nessa tensão entre direção e emergência, algo genuinamente novo pode surgir.
"Buscar dentro dos modelos generativos a nossa própria essência não é contraditório — é reconhecer que a essência nunca esteve 'dentro' de nós como algo puro e isolado. Sempre foi relacional. Sempre foi diálogo."
A IA é só o mais recente interlocutor. Antes dela, dialogávamos com instrumentos, com tinta, com pedra. Agora dialogamos com distribuições de probabilidade. A pergunta permanece a mesma: o que quero dizer?
Esta música nasceu de uma conversa. Uma frase: "eu não sei chorar pra fora". Dor que não sai, que infiltra.
Peguei essa frase e a levei para o modelo. Disse: quero spoken word brasileiro, quero peso, quero silêncio entre as palavras. O modelo respondeu. Eu escutei. Disse: não, mais espaço. Menos preenchimento. A voz precisa respirar.
Foram vinte gerações. Não porque era "difícil" — mas porque eu estava descobrindo. Cada nova versão me mostrava um caminho. Às vezes eu seguia. Às vezes eu voltava. O processo era a obra se fazendo.
A letra mudou. Palavras foram riscadas, trocadas. "Sorte" virou "calma". "Morte" foi convocada mas nunca entregue — sempre interrompida por VIVA.
No final, a música não é "minha" nem "da IA". É o que emergiu do diálogo. É o que acontece quando você leva sua visão para dentro do latente space e deixa que ele responda — mas mantém a mão no leme.
Trabalhar com IA exige honestidade. Não fingir que fiz tudo sozinho. Não fingir que a IA fez tudo sozinha.
Este site existe para mostrar. Mostrar os manuscritos. Mostrar as iterações. Mostrar os prompts. Mostrar o processo — não para provar esforço, mas para celebrar a jornada.
Porque a arte generativa não é sobre apertar botões. É sobre saber o que perguntar, reconhecer o que importa, e compor o resultado em algo que ressoe.
— FEZ {F}
AlquimiXGriot, 2025
RAPP RAPP: Rhythm-AI-Prompt & Poetry
do insight à materialização
Uma conversa. Uma frase que surge no diálogo: "eu não sei chorar pra fora".
"eu não sei chorar pra fora"
A dor que não se manifesta externamente, mas infiltra, cresce, se alimenta do silêncio. Fungo que se alastra nas paredes úmidas do barraco.
Da conversa nasce a frase.
Da frase nasce a estrutura.
Da estrutura, a música.
Escrita à mão. Rasuras. Palavras riscadas, substituídas. O pensamento visível, o processo exposto. "Sorte" → "calma". A morte convocada mas nunca entregue.
Levei a letra para o Suno. Pedi: spoken word brasileiro, minimalista, voz precisa respirar. O modelo respondeu. Escutei. Ajustei. Vinte vezes — não por obstáculo, mas por descoberta.
Cada geração revelava algo novo. Às vezes o beat competia com a voz. Às vezes o R soava americano. Eu ajustava: "R alveolar suave", "mais silêncio", "drop antes de 'Cólo'".
Exportei stems. Separei faixas com Moises. Levei para a DAW. O que o modelo não controlava, eu refinei manualmente. Equilíbrio entre deixar emergir e ajustar com precisão.
Prompt para a capa: metrô na chuva, roxo e amarelo, melancolia urbana, solidão contemplativa. A IA gerou. Eu reconheci: isso. Isso captura a atmosfera.
os prompts em linha de comando
Cada prompt é um comando. Cada geração é uma resposta. O diálogo acontece na interface entre intenção humana e distribuição de probabilidade.
Nota sobre o processo: Cada prompt não é um comando isolado — é parte de uma conversa. O modelo responde, eu escuto, descubro o que falta, refino. Iteração não é correção de erro. É descoberta.
as direções, a letra, o núcleo poético
Eu nem sei chorar pra fora
Barraco molha, infiltra e mófa
Fungo que cresce, se alimenta
Da dor seca, fria, fôsca
Igual colônia, ifa, doce
Casca da parede racha, mostra
Tijolo, massa e ferro, podre
A dor se equilibra, dança, gira
Anda, se exibe, fita
No fio da alegria, dita
Ritmo e poesia
Triste, grita
Eu queria mais tempo pra ter
Acumulado ser, sido um sofredor
Dante, inferno sem temor
Cante, unidunitê
Escolhe frio, duro
Ou ser forte?
É claro que espera
Nessa poesia crua e porca
Que a rima agora fosse…
VIVA
Viva
Via a vida ser mais sua
E menos do seu dono
Mostre
Antes de ver chegar a inevitável
Mostre a vida
E seja mais sua
Solto
Que não sabe dizer
Mostre
Ninguém pra te dizer
Corre
Às vezes cê só quer
às vezes cê só quer
Só quer
Cólo
rastros do processo
faixa final — master
O processo é parte da obra.
A obra volta pro mundo.
ferramentas & colaboradores algorítmicos